Eterno questionador e antenado às novas tecnologias, Will Namen, do “Ciência em Show”, respira, vive, faz e divulga Ciência. Licenciado em Física, pelo Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP), tem seu nome associado, há mais de 20 anos, ao “Ciência em Show”. Já foi apresentador em quadros científicos na TV aberta e no programa Ciência em Casa, do NatGeo / BBC Earth; e, também, é autor dos livros Almanaque Ciência em Show, Almanaque Ciência em Show – Biologia e Nau dos Mestres.

Atualmente, é um dos fundadores do Movimento  Nós Somos a Ciência, que defende a Ciência como base para a tomada de decisões responsáveis à intervenção social. Will foi professor na rede pública e privada e atuou em muitos projetos na USP, entre eles “Atividades Experimentais em Física” e “Show de Física”.

Nesta entrevista, ele conta como surgiu o Ciência em Show, fala sobre as dores e delícias de se fazer Ciência no Brasil e de como popularizar e disseminar a Ciência.

Para Namen, “o grande segredo de qualquer comunicação é fazer com que a pessoa que escute, entenda a mensagem. A comunicação científica é duplamente complexa, pois depende da pessoa entender o que você diz e, ainda, realizar uma segunda abstração intelectual, pois existem conceitos, muitas vezes, que vão contra o senso comum para serem desvendados”. Também aponta a Educação de qualidade e a democracia como caminhos contra esses tempos de negacionismo. “As pessoas precisam sempre dialogar, mesmo que não concordem. Viva o argumento consistente! Viva a diferença de pensamento”, defende!

Vale a pena acompanhar esse diálogo!

WASH: Como surgiu a ideia do Ciência em Show?

Will Namen: O Ciência em Show surgiu nos anos 2000, como uma iniciativa de três estudantes de Licenciatura em Física pelo Instituto de Física da USP. Lá participávamos do projeto de extensão chamado Show da Física, que existe até hoje, coordenado pelo professor Fuad Daher Saad. Com incentivo acadêmico e apoio do ideal, “levar o conhecimento da universidade para fora dos muros da cidade universitária”, surge o CES (Ciência em Show).

WASH: Há quanto tempo o trabalho de vocês está em andamento? Como vocês se definem?

Will Namen: Nosso trabalho já acontece initerruptamente há 20 anos! Um importante marco nesta trajetória, somando muito a nossas iniciativas, completou o time, Ana Ralston – Especialista em tecnologia, Licenciada em Pedagogia e Administração escolar pela Mackenzie, pós graduada em políticas públicas e gestão em inovação pela FGV, trazendo uma verdadeira revolução na organização virtual de nossas atividades e o mais importante, trazendo o olhar da mulher na ciência. Ensinar e comunicar a ciência de maneira descomplicada e descontraída. É nisso que acreditamos e é assim que fazemos há 20 anos no Ciência em Show.

Todas nossas propostas são fundamentadas em sólidos referenciais teóricos e trazem uma visão moderna do ensino, que aproveita espaços diversos para facilitar a aprendizagem.

WASH: Quem foram seus influenciadores?

Falar por todos é difícil, mas no meu caso, Will Namen, fui extremamente impactado pelo programa de tevê, Mundo de Beakeman. Como estamos há tanto tempo na estrada, tivemos muitos motivadores, começamos o CES junto com os Caçadores de Mitos – Discovery Channel.

WASH: Quais são os principais desafios que o Ciência em Show encontra na sua atuação?

Convencer as pessoas do óbvio, que é preciso dar importância a ciência, pois uma sociedade sem cultura científica é uma sociedade fadada a dependência de conhecimento de outros povos, mais doente pois não tem os princípios básicos para se proteger, enganada por não conseguir contestar informações duvidosas. Já cansamos de ouvir que se nosso trabalho fosse feito em outro país, que valoriza a divulgação científica, seríamos muito mais reconhecidos.

WASH: Vocês são três físicos, quais as vantagens e desvantagens dessa composição, além de uma educadora?

Formação não define individualidade. Sermos tecnicamente educados como físicos nos dá a vantagem de podermos discutir, dentro do tema científico, questões de teor técnico e propor experimentos que funcionem sem nos expormos a riscos, já que dominamos o método científico. Desvantagens: pensar muito, criticar sempre e sermos punidos pelo perfeccionismo habitual dos físicos, ou seja, o fato de todos possuírem muitos argumentos, dada a origem questionadora de nossa formação, atrasa um pouco o processo produtivo que é sempre desafiador. Temos a sorte de completar nosso time com uma educadora mulher que contribui muito com a diversidade de pensamento, tão frutífero, em momentos que precisamos propor soluções eficientes para desafios diferentes.

WASH: Quem é o principal público do Ciência em Show, uma vez que vocês trabalham com produtos para escolas, professores, alunos, empresas, oferecem cursos e materiais diversos?

Essa é uma pergunta extremamente difícil de responder, a ciência é pra todos, sendo assim não existiria um público específico. Gostaríamos que fossem todos, no entanto, não funciona bem assim. Apesar de falarmos para o público em geral, observamos, através de nossas redes sociais, público jovem em idade escolar a partir de 12 anos, e também um interesse específico de professores e adultos até 54 anos. A questão de gênero está bem dividida.

WASH: O que mudou no Ciência em Show do seu início para estes tempos tão tecnológicos?

A pergunta é bem ampla. Quando iniciamos nossas atividades, 20 anos atrás, a internet era pouco difundida, a principal mídia era a televisão, existiam disquetes para armazenamento de dados, o CD era novidade, enfim… O mundo mudou em 20 anos. Mas como uma empresa de pensadores, acompanhamos a evoluções tecnológicas propostas, e hoje, por exemplo, além dos nossos produtos analógicos, possuímos uma gama de soluções digitais que variam de vídeo experimentos a cursos de formação a distância para professores.

WASH: Existem segredos para disseminar e popularizar a Ciência com resultados? A saída é aproximar as temáticas do dia a dia do público, é abusar do lúdico, do humor, da arte e do entretenimento?

O grande segredo de qualquer comunicação é fazer com que a pessoa que escute, entenda. A comunicação científica é duplamente complexa, pois depende da pessoa entender o que você diz e ainda, realizar uma segunda abstração intelectual, pois existem conceitos, muitas vezes que vão contra o senso comum para serem desvendados. Todas as técnicas que tornem essa conversa efetiva valem.

WASH: Como você avalia os programas de TV que também abordavam Ciência como, por exemplo, o X Tudo, o Mundo de Beakman, Tíbio e Perônio, Eureka entre outros. Afinal, qual a diferença da abordagem da Ciência nestes programas para o trabalho de vocês ou vocês seguem uma mesma linha de ensinar Ciência com entretenimento? Esses Programas fazem falta?

Todos esses programas que você citou são pioneiros de gerações de pessoas curiosas, que viram a ciência como uma oportunidade de profissão. Sem dúvida nenhuma que nos inspiramos nelas e, muitas vezes, nos citavam referencialmente como algo entre uma ou outra iniciativa dessas. Pra nós é motivo de muito orgulho ser colocado neste hall. A abordagem é praticamente a mesma, lançar mão do lúdico para quebrar a barreira inicial do difícil _ que ciência é coisa pra gênio.

A falta de programação com grande impacto na mídia, falando de ciência é extremamente devastadora. Como influenciar novas gerações a seguir carreiras científicas se não damos oportunidade delas se encantarem com a ciência?

WASH: Por que o espaço que a Ciência ocupa nos canais de comunicação e mesmo na mídia hoje é tão reduzido? A pesquisa sobre Percepção Pública da Ciência de 2019 traz esse cenário de desinteresse das mídias por Ciência nos últimos anos. Como vocês avaliam isso e isso pode mudar a partir da Pandemia?

Porque a importância e o valor ao tema são relegados a segundo plano. Nosso país, habitualmente, por uma série de complexidades, dentre elas as questões de ordem financeira, não trabalha em quase nenhum setor da sociedade com a questão preventiva. As ciências fazem parte de uma parte mobilizada da sociedade civil que deve ser protegida e cultivada a qualquer hora, como uma espécie de anticorpos da sociedade para momentos de defesa de fragilidade civil. Se criarmos a consciência de que somos parte vital e não acessória da nossa sociedade, isso muda. Hoje é um vírus, amanhã uma explosão solar que destruirá toda a comunicação via satélite, outro dia será a colisão de um asteroide. Temos que conseguir reagir imediatamente.

WASH: Existe um lugar comum na sociedade que o cientista é um ser excêntrico e que tem uma linguagem muito complicada. Quando tocamos neste ponto, lembro que vocês afirmam, com determinada frequência – pelos menos eu pude acompanhar uma TED de vocês –   que um dos principais problemas da Ciência é a comunicação. Geralmente, o cientista não gosta muito de compartilhar seu conhecimento e, também, tem dificuldades com a imprensa. Você acredita que isso vem mudando ou o caminho é longo ainda?

Acreditamos sim, lentamente, bem mais devagar do que as Fake News, que desaceleram esse processo causando uma desinformação generalizada. Um cientista, passa anos estudando um tema específico e que muitas vezes passa a ser óbvio pra ele falar daquilo, e isso faz com que essa comunicação seja comprometida, pois a sua realidade é lugar comum dele. Às vezes, fica difícil até mesmo para outros cientistas. Isso tem mudado, muito mais devagar do que deveria, mas pressionado pela questão de sobrevivência. Vale o dito popular “Quem não chora, não mama”.

WASH: Um dado bem significativo da Pesquisa de Percepção Pública da Ciência, em 2019, mostra que 90% dos brasileiros não sabem citar o nome de nenhum cientista e 88% não conhece nenhuma instituição de pesquisa no país. Como vocês avaliam isso? Viver de ciência é viver no esquecimento, mesmo? Como mudar isto?

Responder com uma pergunta parece querer fugir da resposta, mas neste caso vale. Pergunte aos mesmos brasileiros em quem eles votaram para, vereadores, deputados, prefeito, governador ou presidente. Ou o que fazem os três poderes e quem trabalha neles?

Pergunte aos mesmos brasileiros qual foi a renda do último jogo de seu time de coração e qual foi a escalação com nome, sobrenome e quem estava no banco.

Absolutamente nada contra o esporte, muito pelo contrário, temos que incentivar cada vez mais. A questão aqui é a de valor, cultura científica e escolaridade. É injusto perguntar isso para pessoas que precisam do básico ainda. Viver de ciências é como viver de qualquer profissão difícil tanto quanto os desafios que nos é imposto, brilhante e inesquecível tanto quanto nos propusermos que seja.

WASH: Vocês, do Ciência em Show, já participaram de atividades com a equipe do WASH, vocês conhecem o Programa? Como foi essa experiência?

Conhecemos esse magnífico projeto no CTI Renato Archer em Campinas, por intermédio de seu diretor Victor Mammana. É muito gratificante saber que mais pessoas sérias, com senso público, e com preocupação enorme com o próximo, lutam para levar para pessoas com menores oportunidades a ciência. Isso só nos motiva a estar cada vez mais próximos e alinhados com ideias tão nobres.

WASH: Conte-nos sobre a iniciativa do Movimento Nós Somos Ciência, lançado nestes tempos de Pandemia. O que é o Movimento, o que ele propõe e quem reúne? Quais são os próximos passos?

Movidos pelo desejo de aproximar a ciência do povo e combater o obscurantismo no atual cenário pelo qual passa o país, usando comunicação científica como poderosa ferramenta. Evidenciar a importância da ciência e mostrar a relevância dela para a tomada de decisões pela sociedade é uma de nossas missões.

O movimento se preocupa em promover ações que mantenham a população bem informada e atualizada quanto aos desdobramentos da pandemia, bem como outras ações de comunicação científica.

Pretendemos continuar apoiando ações que visem comunicar ciência para não cientistas, pretendemos criar prêmios de incentivo a iniciação científica no ensino médio e posteriormente, fomentar pesquisadores que perderem bolsas, criando uma forma independente de fomento a pesquisa no país.

WASH: Pós-pandemia, você acredita que a Ciência ganhará lugar de maior destaque na sociedade e na agenda política? Agora mesmo, o Brasil não participou do fundo mundial para desenvolvimento de pesquisas sobre vacinas contra o Coronavírus, em plena pandemia. Recentemente, vivenciamos uma grande dificuldade com a vacinação contra o sarampo e vimos a doença voltar com toda força. Como enfrentar esse movimento negacionista e retrógado com o conhecimento científico?

Como toda dor recente, a ciência está em voga, momentaneamente sim. Sociedade, política e comunicação colocaram a ciência no olho do furacão; historicamente foi assim. Nas grandes guerras, a ciência recebeu muito apoio e recursos (claro que pelo motivo equivocado, quase sempre). Num mundo globalizado, crises de ordem mundial serão cada vez mais constantes. Por esse motivo a ciência não deve ser moda e sim avant première.

A única forma de enfrentar o negacionismo é com educação de qualidade e democracia. As pessoas precisam sempre dialogar, mesmo que não concordem. Viva o argumento consistente! Viva a diferença de pensamento.

Texto: Denise V. Pereira
Revisão: Nádia Abilel de Melo
Fotos: Arquivo pessoal – Prof. Eberval Castro

Compartilhe!

Mais Notícias

    WASH nas redes

    Leia no site:

    No post found!

    Realização

    logo cemaden
    ministério da ciência, tecnologoa e inovação

    Parcerias

    Logo - Nós somos a ciência
    Logo - Companhia Cultural Bola de meia

    EMEF Prof.
    ORLANDO CARPINO
    Campinas – SP

    Escola Municipal
    LAMARTINE DELAMARE
    Jacareí – SP

    Escola Municipal
    TANCREDO DE ALMEIDA NEVES
    Campos do Jordão – SP