Avaliação do programa One Laptop per Child (OLPC) e as origens do WASH

Elaine da Silva Tozzi, Victor Pellegrini Mammana

Resumo

Este trabalho busca apresentar uma descrição histórica sobre o Programa WASH – Workshop Aficionados em Software e Hardware, mostrando que o programa teve como origem a avaliação do Projeto One Laptop per Child, realizada pelo CTI Renato Archer e outras 2 instituições na década passada. O Projeto OLPC foi proposto por NICHOLAS NEGROPONTE do MIT, ao Governo Federal durante a reunião de Davos em 2004, e a avaliação do OLPC se deu por pelo menos mais 4 anos subsequentes. Neste trabalho serão apresentadas algumas das conclusões da avaliação do OLPC, mostrando que aquele estudo foi importante para a concepção do programa WASH.Introdução

  1. Em 2004, o CTI Renato Archer foi designado pela Presidência da República para atuar na avaliação do projeto “One Laptop per Child” (OLPC), proposto por Nicholas Negroponte do Media Lab [XXX]. A proposta fora apresentada à Presidência da República na reunião de Davos ocorrida naquele ano. Tratava-se de uma complexa iniciativa que buscava, através do uso intensivo de tecnologia da informação, romper com deficiências dos sistemas de ensino de todo o mundo, particularmente dos países em desenvolvimento. O OLPC propunha a distribuição intensiva de “laptops” ou “notebooks” conectados em rede como forma de garantir acesso de estudantes do ensino fundamental e médio à internet. Segundo a visão da época, este tipo de acesso permitiria romper com práticas convencionais de ensino, que vinham perdendo relevância social. Tratava-se de um projeto de alta complexidade, dado que envolvia questões pedagógicas, industriais, de software, ergonomia, entre outros. Ao longo da avaliação, ficou claro para o CTI que a implantação de um programa desta natureza envolveria impraticáveis orçamentos federais, principalmente pela necessidade de aquisição de milhões de notebooks, os quais em poucos anos ficariam obsoletos, dentre outros problemas estruturais no projeto.
  2. Não obstante a recomendação do CTI para que o projeto não fosse adotado, outros aspectos da metodologia proposta pelo MIT chamaram positivamente a atenção de educadores e cientistas brasileiros, que propuseram programas de educação informal no contraturno como alternativa. Este trabalho busca apresentar esta história.

Materiais e Métodos

  1. O Programa OLPC foi avaliado, a pedido da Presidência da República, durante alguns anos por 3 instituições brasileiras: o CTI Renato Archer, o Laboratório de Sistemas Integráveis e a Fundação CERTI. Vários aspectos do projeto foram avaliados, a saber: proposta pedagógica, modelo de negócios, sustentabilidade, redes, política industrial, software, ergonomia e conteúdo. A proposta previa a aquisição de um “laptop” por estudande brasileiro, ou seja, perto de 30 a 40 milhões de unidades.

Segundo a visão trazida pelo MIT, a disponibilização em larga escala de acesso à internet viabilizava uma alteração da relação aluno-professor, promovendo outras formas de aprendizagem alternativas ao conteudismo tradicional, reformulando também o formato lousa-giz inerente ao sistema educacional brasileiro.

  1. A base teórica do Projeto OLPC foi a proposta original de SEYMOUR PAPPERT, matemático e pedagogo do MIT que defendia a aprendizagem de programação de computadores como forma de melhorar o desempenho dos estudantes em matemática e ciências. Um dos aspectos principais do projeto, do ponto de vista das ferramentas de software, era a disponibilização de uma ferramenta de programação mais intuitiva e lúdica do que o próprio LOGO, linguagem de programação muito difundida no contexto educacional a partir da década de 60.
  2. Foi no contexto da análise do Projeto OLPC que o CTI tomou conhecimento do esforço do MIT de desenvolvimento da ferramenta Scratch, através do Professor STEPHEN RESNICH. Também naquele momento foi possível ao CTI conhecer as propostas de educação informal no contraturno, baseadas em conteúdos de ciências, tecnologia, engenharia e matemática (STEM), desenvolvidas por DAVID CAVALLO, também um expoente do MIT.
  3. Em sua análise, o CTI desempenhou uma série de atividades, tais como:
  • a) avaliação de características de ergonomia postural, por meio da captura de movimento;
  • b) avaliação de características de ergonomia sensorial, por meio de técnicas relacionadas à área de mostradores de informação;
  • c) avaliação da funcionalidade dos “laptops”, principalmente em termos de redes, processamento, memória e baterias;
  • d) avaliação do emprego dos dispositivos no âmbito da escola pública;
  • e) avaliação da percepção dos professores sobre o projeto;
  • f) análise da infraestrutura das escolas, visando verificar a viabilidade de implantação do projeto;
  • g) acompanhamento de pilotos de avaliação em escolas públicas brasileiras.
  • h) visitas a pilotos nos Estados Unidos.

Em sua análise, o CTI utilizou como definição de educação o seguinte conceito:

“Educação é a inserção do indivíduo em sua própria cultura através da interação com outros indivíduos”.

Resultados e Discussão

  1. Do ponto de vista da aquisição de “laptops” em larga escala, o CTI identificou uma série de dificuldades nas seguintes áreas: apropriação pela escola brasileira, produção dos laptops, restrições orçamentárias, problemas ergonômicos e, principalmente, obsolescência dos equipamentos. Estes aspectos demonstraram que a ideia de aquisição de milhões de laptops representava um risco muito grande para o sistema educacional brasileiro.
  2. O estudo apontava, também, que o sistema educacional poderia se beneficiar de alguns aspectos da proposta, mas que qualquer iniciativa disruptiva no sistema educacional brasileiro requereria mais investimentos em recursos humanos do que em hardware ou software, como era o caso do Projeto OLPC. Esta percepção de que o Projeto OLPC era desfocalizado nascia da própria definiçãod e educação empregada pelo CTI (ver acima). Nesta definição, ficava evidente que qualquer esforço de qualificação da escola brasileira precisaria passar por uma ênfase no investimento em “indivíduos” e não em software ou hardware.
  3. Um dos resultados principais da avaliação desenvolvida pelo CTI foi a proposta de uma alternativa ao OLPC, com custo inferior, que não exigia a aquisição de milhões de equipamentos, centrando o investimento na produção de espaços de interação no contexto de valores do método científico, como o grupo de avaliação pode testemunhar durante a visita a alguns dos pilotos nos EUA.
  4. A avaliação do Projeto OLPC produziu uma resignificação que, aproveitando os melhores aspectos daquela proposta, se consolidou na ideia do “WASH – Workshop de Aficcionados em Software e Hardware”.
  5. O WASH se constitui em atividades em grupo, realizadas no contraturno, desvinculadas do currículo tradicional da escola formal, cujos valores principais se alicerçam no método científico. O WASH não é um curso, mas se constitui em espaços de interação humana para experimentação e convivência entre indivíduos, no contexto do desenvolvimento de projetos de vários níveis de complexidade.
  6. Pela forma como os pilotos do WASH acabaram sendo implementados no contexto do CTI Renato Archer, houve a consolidação da visão de que instituições de P&D têm um papel a desempenhar no contexto da educação informal no contraturno, estabelecendo uma ponte direta entre centros de excelência e a escola pública brasileira.

Conclusões

A avaliação do Projeto do OLPC permitiu ao CTI Renato Archer compreender mais profundamente os desafios do uso intensivo de tecnologia da informação no contexto da escola pública brasileira. Com o intuito de viabilizar a implantação de algumas das propostas do OLPC, eliminando os aspectos que se mostravam insustentáveis, o CTI buscou uma alternativa que concentrasse os investimentos no bem mais valioso de qualquer processo educacional: o ser humano.Agradecimentos e apoios

  1. V.PM. e A.C.P. agradecem o apoio da FINEP, que financiou o programa de avaliação do OLPC. E.S.T. agradece ao Instituto Federal pela oportunidade de desenvolver este trabalho no âmbito do curso Especialização em Educação para a Inserção Social. Os autores agradecem aos membros da Comunidade da Vila Olímpia, bem como aos bolsistas e voluntários do Projeto WASH pelo apoio às atividades que vêm sendo realizadas.

Referências

CTI Renato Archer, https://cti.gov.br/pt-br, consultado em 02/06/2018

MIT, Instituto de Tecnologia de Massachusetts, http://web.mit.edu/, consultado em 02/06/2018

NEGROPONTE,NICHOLAS. “Brazil Plan: OLPC”, comunicação privada do MIT para os institutos responsáveis pela avaliação do projeto.

PAPPERT, SEYMOUR. Children’s Machine, 1980

CAVALLO, DAVID, homepage: http://web.media.mit.edu/~cavallo/

Scratch Brasil,www.scratchbrasil.com.br