Duilia tem, ainda, pós-doutorado no Observatório Cerro Tololo, no Chile; no Observatório Nacional, no Rio; e no Instituto do telescópio espacial Hubble, nos EUA. Foi, também, professora assistente na Universidade Chalmers, na Suécia. A sua história na Universidade Católica de Washington teve início, em 2003, quando era pesquisadora associada da NASA Goddard Space Flight Center. Foi professora no Departamento de Física, em 2008, e, hoje, é vice-reitora da Universidade Católica, além de continuar a colaboração com a NASA Goddard.
Na semana, após o Programa WASH destacar no Projeto Ciência e Cultura o tema “Estrelas e Constelações”, a conversa com Duilia para o site do WASH ampliou o debate sobre temas como as nossas origens. “Tudo o que respiramos, tocamos e vemos foi feito dentro das estrelas. O ferro no nosso sangue, o cálcio nos ossos e toda a tabela periódica são produtos da evolução estelar,” afirma a astrônoma.
O diálogo abordou, ainda, o ensino sobre o universo. Neste ponto, Duilia destaca: “é vital para o progresso da humanidade que as escolas mostrem como chegamos às conclusões científicas”.
E teve muito mais: sobre a corrida espacial, a pesquisadora da Nasa defende que “foi a corrida espacial que alavancou o avanço tecnológico dos últimos 50 anos. O Brasil é a única das 10 maiores economias do mundo que não tem um programa espacial relevante.”
A conversa seguiu, também, sobre questões relacionadas ao Programa de Satélites, temas atuais como o que vem acontecendo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e o monitoramento da Amazônia.
E não faltaram abordagens sobre vida extraterrestre e os impactos da tecnologia espacial no dia a dia da população. “Quem já fez cirurgia nos olhos já se beneficiou de tecnologia espacial. Quem já usou GPS ou o próprio celular, também, se beneficiou dela. Quando investimos em tecnologia espacial, estamos investindo em inovação aliada à tecnologia”, argumenta.
Nessa entrevista, Duilia conta, ainda, como foi o processo que culminou na sua principal descoberta, a da estrela Supernova SN 1997D, no Chile, em 1997, quando tinha 34 anos.
A astrônoma e pesquisadora é autora de dois livros: “Vivendo com as Estrelas” e as “Aventuras de Pedro, uma pedra espacial”.
E só para aumentar o nosso orgulho, para além dos reconhecimentos e títulos que sobram: Duilia nasceu em nossa região. É de Jundiaí, SP.
O universo foi o limite dessa entrevista. Não dá para não ler!
A Ciência no Brasil
Programa WASH: A paixão pela ciência tem que começar cedo, mesmo? Existe um momento ideal?
Não é preciso; mas, muitas vezes, começa cedo, quando a criança desperta curiosidade sobre os planetas e o universo, de uma forma geral. E, quando começa cedo, é bom estimular para que não se perca o interesse.
Programa WASH: No Brasil, existe uma epidemia “do eu não gosto de Matemática”. Como desconstruir esse discurso, que tem impacto na formação de cientistas? Enfim, como incentivar o gosto por essa área? Em alguns países, existe um estímulo para isso. Essa epidemia é comum também nos EUA?
O problema não é bem não gostar da matemática, mas não gostar de ciências. Quem gosta de ciências vai ter que gostar de matemática, para poder entender ciências. Acho que estimulando o gosto pelas ciências se estimula, também, a matemática. Esta falta de curiosidade científica não acontece só no Brasil, é mundial. Pode ser que seja uma consequência do período tecnológico que vivemos e do fácil acesso à informação.
Programa WASH: As escolas no Brasil ensinam pouco sobre o universo, sobre os planetas; nos Estados Unidos é diferente? O universo não deveria ter mais tempo nas grades escolares?
Deveríamos ensinar mais, em todos os países. No Brasil e nos EUA, não se ensina o suficiente. Mas, seria importante ensinar o método científico também, e não só decorar nomes. É vital, para o progresso da humanidade, que as escolas mostrem como chegamos às conclusões científicas.
Programa WASH: A Sra. tem acompanhado a questão do INPE? Como a Sra. vê o papel do órgão no desmatamento da Amazônia e a saída da coordenadora dos trabalhos de monitoramento da região da Amazônia, Núbia Vinhais, recentemente? Fato que começa a ser rotina, quando dados de alertas que revelam “verdades inconvenientes” são divulgados.
É muito preocupante a situação do INPE. O papel do instituto é fundamental no monitoramento da Amazônia e, sem uma administração feita por pessoas que entendem do assunto, ficaremos sem credibilidade. O planeta está passando por aquecimento global e precisamos entender o planeta melhor, para tentarmos reverter o quadro criado pelos seres humanos. Quando falamos de entender o planeta, é fundamental que saibamos o que está se passando na região da Amazônia, pois a floresta e os rios têm um papel vital no ecossistema do planeta. O monitoramento da Amazônia vai além da política. É uma questão de sobrevivência das espécies, de sobrevivência do ser humano.
Programa WASH: O que o Brasil perde em não investir em programas espaciais? Eles costumam ser tão absurdamente caros, que os retornos podem não ser proporcionais aos investimentos?
O Brasil perde muito. Foi a corrida espacial que alavancou o avanço tecnológico dos últimos 50 anos. O Brasil é a única das 10 maiores economias do mundo que não tem um programa espacial relevante. Os programas espaciais são caros, mas são transformadores também. O parque industrial que um programa espacial constrói ao seu redor gera tecnologia, emprego e desenvolvimento regional. Mas, para estabelecer um programa espacial competitivo é necessário investimento a longo prazo e este é o problema do Brasil. Somos muito imediatistas e não entendemos que os frutos dos programas espaciais podem demorar décadas.
Programa WASH: A Sra. acompanha o Programa de Satélites brasileiros, qual a sua visão sobre o tema?
O Brasil é tímido, no que diz respeito ao programa de satélites. Poderia investir mais no assunto, pois tem grandes institutos como o INPE e o ITA, além de ter tradição com a Embratel (Star One). Espero que a Agência Espacial Brasileira receba mais investimentos e possa alavancar o programa de satélites. Temos que lembrar que não é apenas um investimento no satélite em si, mas na tecnologia que vai ser gerada para a construção do satélite.
O universo e o futuro
Programa WASH: Em suas entrevistas, a Sra. sempre coloca que somos pó de estrelas. A Sra. poderia dividir com nosso público essa sua explicação?
A luz das estrelas vem da transformação química, que acontece dentro das estrelas. No final de suas vidas, elas explodem e lançam no espaço todos os elementos químicos fabricados, onde novas gerações de estrelas e planetas serão formadas. Tudo o que respiramos, tocamos e vemos foi feito dentro das estrelas. O ferro no nosso sangue, o cálcio nos ossos e toda a tabela periódica são produtos da evolução estelar.
Programa WASH: Quais são as principais discussões em curso sobre o universo e que novidades podemos esperar para os próximos anos? Quando será descoberta vida fora da terra? Muitos cientistas dizem que em 10 anos isso possa acontecer, com a descoberta dos exoplanetas. Essa geração vai vivenciar essa descoberta e qual o impacto disso para a Ciência, para as questões religiosas etc.?
Uma das novidades será o lançamento do telescópio espacial James Webb, em 2021. Ele irá observar o universo mais profundo e somente no infravermelho. Com ele, veremos as primeiras estrelas e as primeiras galáxias. Estudaremos, também, os planetas ao redor de outras estrelas. Fica difícil de dizer exatamente quando faremos descoberta de vida extraterrestre. Com certeza, será muito impactante, pois mostrará que não estamos sozinhos no universo e nos posicionará dentro do universo sem ser algo único.
Programa WASH: Neste ano, houve o lançamento da Space X, na missão para Marte. A Sra. poderia falar sobre os impactos da corrida espacial para o dia a dia das pessoas, que, muitas vezes, se assustam com os enormes custos e não conseguem ver as vantagens tecnológicas e as aplicações nas suas vidas?
O mais importante do lançamento da Space X foi mostrar para o mundo que uma empresa privada também é capaz de lançar astronautas ao espaço. Mas, estamos longe da época em que a viagem espacial será corriqueira. Mas, os benefícios da ciência espacial são enormes para a evolução tecnológica. Quem já fez cirurgia nos olhos já se beneficiou de tecnologia espacial. Quem já usou GPS ou o próprio celular, também, se beneficiou dela. Quando investimos em tecnologia espacial, estamos investindo em inovação aliada à tecnologia. Os enormes benefícios que as câmeras digitais trouxeram para a humanidade vão além da fotografia bonita. Hoje em dia, as descobertas de células cancerígenas são feitas através da análise das imagens digitais, a mesma tecnologia que utilizamos ao estudar as imagens do universo, tiradas com as câmeras digitas do telescópio espacial Hubble.
Atuação e descoberta
Programa WASH: A Sra. também tem um importante trabalho de divulgação e incentivo à participação feminina na Ciência. Conte pra gente sobre o seu projeto. Como funciona, como as meninas ou mulheres podem participar e se já há resultados, em quais regiões?
Entre o público, eu sou conhecida, também, como a Mulher das Estrelas. Em 2016, eu comecei o projeto A Mulher das Estrelas (AME), que, desde então, já impactou mais de 30 mil crianças e jovens. A meta é mudar o mundo, estudante por estudante, e, para isso, motivo as crianças e, principalmente, as meninas a seguirem o talento. Tento mostrar para elas que elas podem fazer o que gostarem de fazer e que mulheres podem ser cientistas, também.
Programa WASH: O que representou para a Sra. e para o mundo a descoberta da Supernova 1997D, podemos rememorar – e qual é o grande desafio ou descoberta que o mundo precisa buscar no universo, num futuro próximo?
Na ocasião, eu já era doutora em astronomia e bolsista do CNPq, no Observatório Nacional, no Rio; e estava em La Silla, no Chile, observando uma amostra de galáxias. Eu era uma observadora experiente. Já havia utilizado este telescópio de 1,52m em outras oportunidades e não necessitava de assistente noturno, pois dava conta do telescópio, sozinha. Eu comecei a observar, assim que escureceu, e seguia a lista de prioridades que eu havia feito para aquela noite. Cada vez que mudava de objeto, eu consultava o mapa da região do céu onde estava a galáxia, que eu deveria observar.
Lá pela uma da madrugada, após apontar o telescópio para a coordenada de uma das galáxias, comecei a contar estrelas, identificando, precisamente, quem era quem no mapa do céu e no visor da buscadora. A galáxia em questão, NGC1536, praticamente não aparecia no visor, pois é um objeto muito distante. Mas, próxima à posição da galáxia, havia uma estrela no visor que não estava no mapa. Por triangulação, calculei a posição da estrela intrusa em relação à galáxia e, para minha surpresa, verifiquei que a estrela estava superposta à galáxia! Foi aí que decidi rodar o instrumento, que eu iria utilizar na observação da galáxia, um espectrógrafo, e centrá-lo exatamente sobre a posição do objeto estranho. Eu poderia ter deixado – ter decidido a observar apenas o núcleo da galáxia, sem incluir a estrela na fenda do espectrógrafo. Mas, curiosidade é um dos meus pontos fracos e não pude resistir. Na noite seguinte, a descoberta foi confirmada com um outro telescópio e enviamos o telegrama informando à UAI – União Astronômica Internacional. Foi a UAI, que nomeou a supernova de SN1997D, por ter sido a quarta a ser descoberta no ano de 1997. Ainda hoje, a SN1997D é muito estudada, porque ela é uma das menos brilhantes.
Ainda não sabemos muito sobre a matéria escura e a energia escura. Estes são temas bem importantes da próxima década.
Entrevista e texto: Denise Pereira e Victor Pellegrini Mammana
Revisão: Nadia Abilel de Melo
Fotos: Arquivo Pessoal Duilia de Mello


Compartilhe!
Mais Notícias
WASH nas redes
Leia no site:
No post found!
Realização
Parcerias






EMEF Prof.
ORLANDO CARPINO
Campinas – SP
Escola Municipal
LAMARTINE DELAMARE
Jacareí – SP
Escola Municipal
TANCREDO DE ALMEIDA NEVES
Campos do Jordão – SP